quarta-feira, 2 de abril de 2014

Agricultura Familiar Socialmente Justa

Brasil fomenta o destaque às mulheres rurais


Mudança de vida. Tatiana Muniz de Siqueira, pescadora de 41 anos e moradora de Tibau, município a oeste do Rio Grande do Norte, define assim a fase em que vive atualmente.
Há 15 anos, Tatiana está à frente da Rede Xique Xique de Comercialização Solidária, que tem sua sede no Território da Cidadania Açu-Mossoró (RN), porque, segundo ela, fica mais fácil o acesso de todos os 350 associados – o orgulho da pescadora é que, desses, mais de 200 são mulheres.
Tatiana, além de dividir as despesas da casa com seu companheiro, é mãe de três meninas – duas delas ajudam nos trabalhos da Xique Xique. E é junto com sua família que ela toma conta da Rede que é formada por associações, grupos informais e formais e unidades familiares de artesãos, pescadores, agricultores, piscicultores etc.
O trabalho de Tatiana consiste no beneficiamento do pescado, produzindo, dentre outros itens, linguiça e almôndega. “Mas temos também o grupo de mulheres marisqueiras, as produtoras de mel, de castanha, de hortaliças. É uma diversidade muito grande”, define a pescadora.
O trabalho dessas mulheres é, em grande escala, baseado na agroecologia, que consiste em uma proposta alternativa de agricultura familiar socialmente justa, economicamente viável e ecologicamente sustentável – bandeira levantada ainda em 2013 e ressaltada em 2014, declarado o Ano Internacional da Agricultura Familiar (AIAF).
Segundo dados do ETC Group - Action Group on Erosion, Technology and Concentration, três bilhões de agricultores familiares, camponeses e indígenas no país são responsáveis pela produção de 70% dos alimentos do mundo todo, em média. E as mulheres já representam 49% da população da área rural. 
“A produção das mulheres na agricultura nem sempre é reconhecida como resultado do seu trabalho, sendo muitas vezes considerada como mera ‘ajuda’ ao trabalho realizado pelos homens. Nos últimos anos, o Brasil vem adotando estratégia para ampliar e fortalecer a participação econômica das trabalhadoras rurais, por meio da garantia de acesso aos recursos produtivos, da sua participação social e da promoção da cidadania” explica a coordenadora-geral de Organização Produtiva e Comercialização da Diretoria de Políticas para Mulheres Rurais do Ministério do Desenvolvimento Agrário (DPMR/ MDA), Renata Leite.
Renata lembra que o MDA disponibiliza diversas ações voltadas para o público feminino, como o Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural (PNDTR); o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que disponibiliza uma linha de crédito só para as mulheres; serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater); apoio em programas da reforma agrária; dentre outros. “A participação desse público vem aumentando muito nos programas de políticas agrícolas e agrárias e queremos dar cada vez mais visibilidade ao trabalho feminino”, diz. 
Evolução
A pescadora Tatiana Muniz diz que não foi fácil começar os trabalhos da Rede, mas, graças à perseverança de dez mulheres e dez homens que estavam à frente em 1999, foi possível.
“Tínhamos uma dificuldade muito grande na parte de comercialização dos nossos produtos. Antes, tínhamos a ajuda do atravessador (que pegava os produtos prontos só para vendê-los), mas não deu muito retorno financeiro às mulheres. A partir do momento que começamos a ter serviços de Ater e melhor orientação, surgiu a ideia de implantar a Rede Xique Xique”, relembra Muniz.
E ela faz questão de ressaltar que os mais de 350 associados devem seguir alguns princípios para participar dos negócios. “Para entrar na Rede, tem que ser produtor, participar das discussões de agroecologia que promovemos e cumprir os três eixos da Carta de Princípios (agroecologia, feminismo e economia solidária)”, conta.
Por enquanto, o trabalho da Rede se limita ao Rio Grande do Norte, com venda dos produtos na sede (Mossoró), em feiras locais e fora do estado. Mas eles pretendem expandir para outras unidades federativas, como Maranhão, Paraíba, Pernambuco e Rio de Janeiro.
Tatiana salienta que todo esse trabalho das mulheres e seus parceiros faz parte da mudança de vida dentro das unidades familiares. “Existe uma força muito grande, a partir do momento em que a mulher se encaixa na agricultura familiar, em que ela se empenha, que está dentro das discussões. Ela começa a mudar. A mulher muda na questão da autonomia, do conhecimento, não é mais aquela que fica no canto, sujeita a qualquer tipo de violência, mesmo porque ela já sabe discutir e sabe o que quer”, define. 
AIAF 2014
O Ano Internacional da Agricultura Familiar (AIAF) é fruto da iniciativa de movimentos sociais do campo com apoio de vários governos, especialmente do Brasil, iniciaram uma campanha em 2008 para que as Nações Unidas adotassem a proposta de um Ano Internacional da Agricultura Familiar.
O objetivo é despertar na sociedade a discussão e inclusão de políticas específicas que favoreçam o reconhecimento e o desenvolvimento sustentável da agricultura familiar com igualdade entre homens e mulheres.

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